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Cultura dos editais – O remédio amargo dos artistas

Especiais - 13/11/2011
Cultura dos editais – O remédio amargo dos artistas Almandrade (com Bernardo): o artista é um técnico passivo com direito a diploma - Foto: Divulgação
p/ Almandrade

O artista que passa o tempo recluso na solidão do atelier,
trabalhando, desenvolvendo sua experiência estética, como um operário
da linguagem e do pensamento, está em extinção. É coisa de museu. Ou
melhor, é raridade nos museus de arte, hoje em dia, que estão deixando
de ser instituições de referência da memória para servir de cenários
para legitimação do espetáculo. Às vezes com míseros recursos que
ficamos até sem saber, quando deparamos com baldes e bacias nessas
instituições, se são para amparar a pingueira do telhado ou se trata
de uma instalação, contemplada por um edital para aquisição de obras
contemporâneas. O que interessa na política cultural nem sempre é a
arte e a cultura, e sim, o glamour. Em nome da arte contemporânea
faz-se qualquer coisa que dê visibilidade.
As políticas públicas foram relegadas às leis de incentivo à cultura e
aos editais públicos. Nunca se fez tantos editais neste País, como
atualmente, para no fim fazer da arte um suplemento cultural, o bolo
da noiva na festa de casamento. Na fala do filósofo alemão Theodor
Adorno: “As obras de arte que se apresentam sem resíduo à reflexão e
ao pensamento não são obras de arte”. Do ponto de vista da reflexão,
do pensamento e do conhecimento, a cultura não é prioridade. Na
política dos museus, o objeto já não é mais o museu que se
multiplicou, juntamente com os chamados centros culturais, nos últimos
anos. Com vaidade de supermercado, na maioria das vezes eles
disponibilizam produtos perecíveis, novidades com prazo de validade,
para estimular o consumo vetor de aquecimento da economia. A
qualificação ficou no papel, na publicidade do concurso.
Esses editais que bancam a cultura são iniciativas que vem ganhando
força. Mostram ser um processo de seleção com regras claras para
administrar o repasse de recursos, muito bem vendido na mídia, como um
método de democratizar o acesso e a distribuição de recursos para as
práticas culturais. Mas nem tão democrático assim. Podem ser um
instrumento possível e eficiente em certos casos, mas não é a solução,
é possível funcionar também, como escudo para dissimular
responsabilidades pela produção, preservação e segurança do patrimônio
cultural. Considerando-se ainda a contratação de consultorias,
funcionários, despesas de divulgação, inscrição, o trabalho árduo e
apressado de seleção, é um custo considerável, em último caso, gera
serviços e renda.
O artista contemporâneo deixa de ser artista para ser proponente,
empresário cultural, captador de recursos, um especialista na área de
elaboração de projeto, com conhecimentos indispensáveis de processo
público e interpretação de leis. Dedica grande parte de seu tempo
nesse processo burocrático de elaboração e execução de projeto,
prestação de contas, contaminado pela lógica do marketing,
incompatível para o artista que aposta na arte como uma opção de vida
e meio de conhecimento que exige uma dedicação exclusiva. Ou então,
ele fica à mercê de uma produtora cultural, para quem essa política de
editais e fomento à cultura é um excelente negócio.
Uma coisa é preocupante, se essa política de editais se estender até a
sucateada área da saúde. Imaginem uma seleção pública para pacientes
do Sistema Único de Saúde que necessitam de procedimentos médicos, os
que não forem democraticamente contemplados, teriam que apelar para a
providência divina, já engarrafada com a demanda de tantos pedidos.
Nem é bom imaginar. Que esta praga fique restrita nos limites da
esfera cultural, pelo menos é uma torneira que sempre se abre para
atender parte de uma superpopulação de artistas / proponentes
pedintes.
O artista, cada vez mais, é um técnico passivo com direito a diploma
de bem comportado em preenchimento de formulário, e seu produto
relegado ao controle dos burocratas do Estado e aos executivos de
marketing das grandes empresas. Se o projeto é bem apresentado com boa
justificativa de gastos e retornos, o produto a ser patrocinado ou
financiado, mediano, não importa. O que importa é a formatação, a
objetividade do orçamento, a clareza das etapas e a visibilidade, o
produto final é o acessório do projeto. Claro, existem as exceções.
Almandrade
Artista plástico, poeta e arquiteto)
Almandrade

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