Os dias começam a ficar mais quentes na Feira de Santana. As baixas temperaturas registradas entre junho e julho – coisa rara nesses tempos de tanta discussão sobre aquecimento global – parece que não vão se repetir até o final do inverno. E ontem a serra de São José, envolta em frequentes chuviscos prateados e em névoa constante desde o início do inverno, amanheceu muito nítida, com o verde da vegetação renovada se insinuando e a palidez da rocha refletindo a luz límpida do sol. Quem saiu agasalhado precisou se despir, ajustar-se à temperatura elevada pelo calor vigoroso.
Os nevoeiros matutinos foram muito frequentes a partir de junho. No início da manhã, os edifícios mais altos ficavam mergulhados na bruma prateada. Mas, em algumas manhãs, mesmo os prédios de poucos pisos e o casario térreo diluíam-se, num efeito fantástico. As ruas compridas desapareciam na névoa clara e, aqui ou ali, muito cedo, transeuntes emergiam espetacularmente, quase como espectros, da cortina leitosa.
Houve dias em que o nevoeiro só começou a se dissipar às oito da manhã. Os primeiros sinais vinham do alto, quando os átomos se dispersavam, expondo o céu azul, banhado por uma luz puríssima. Então, sob um efeito quase mágico, a cortina azul se expandia, dispersando a névoa, condensando a realidade que se expunha na forma da paisagem urbana ordinária: ruas, praças, avenidas e as construções que circundam tudo.
Preguiçosas, saudosas do calor do leito, crianças marchavam para a escola; mulheres saíam para os seus afazeres com agasalhos nos braços; alguns atletas tardios movimentavam-se, exibindo discretos fios de suor. Pelas incontáveis barracas espalhadas pelas ruas, alguns retardavam a chegada para sorver um café quente, degustar um copo de mingau.
Verão
As chuvas também escassearam: desde abril, as precipitações foram quase diárias, ajudando a recuperar uma parte dos estragos provocados pela seca interminável. Em junho, houve fartura no São João; os preços das frutas, das verduras e dos legumes declinaram nos últimos meses, impulsionados também pela recessão. Foi um alento para quem produz – sobretudo o agricultor familiar – e para quem compra, nesses tempos de crise longa e dinheiro curto.
Segundo os mais velhos, que evocam o passado com um brilho nostálgico nos olhos, invernos chuvosos e mais frios eram comuns noutros tempos, décadas atrás. Provavelmente, sim: muitas das inúmeras lagoas feirenses ainda não haviam sido tragadas pela especulação imobiliária e a vegetação no entorno era mais espessa, apesar das afamadas pastagens que alimentavam o gado e dinâmica pecuária das cercanias. Isso contribuía para reduzir a temperatura.
Cientistas defendem que o aquecimento global envolve estações tórridas, mas também invernos gélidos. O clima na Feira de Santana se comportou exatamente assim em 2017: o verão abrasador e implacavelmente seco foi sucedido por uma temporada de chuvas frequentes e frio moderado. Não falta quem, desde já, esteja saudoso da temperatura amena, das madrugadas e manhãs enevoadas.
Setembro já começa a se insinuar no calendário. Os desfiles patrióticos de 7 de Setembro, por exemplo, costumam acontecer sob sol escaldante. Mas ainda faltam quarenta dias para a primavera. Até lá, dizem os especialistas, ainda podemos aguardar eventuais ondas de frio. Os agasalhos, portanto, permanecem à disposição.
André Pomponet é jornalista