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Eduardo Kruschewsky

Um santo remédi

23/09/2013

No meu tempo de funcionário do Banco do Brasil convivi com “figuraças” que faziam parte do quadro de funcionários daquela Casa. Recordo bem de uma delas, o “Bimbinha”, um colega com o qual trabalhei na Agência Centro Salvador.

Figura muito simpática, era metido a conquistador. Às sextas-feiras costumava chegar ao trabalho com uma sacola de onde, no fim do expediente, sacava calça, camisa, perfume, escova de cabelo e se arrumava todo prosa, após tomar um banho “meia sola” tirando água da pia do sanitário masculino. Invariavelmente afirmava:

- Hoje eu vou pra casa da fã! – e lá se ia ele, todo cheiroso,  para a casa da amante...

Quando saiu seu financiamento de casa pela Previ/Carin (Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil / Carteira Imobiliária), “Bimbinha” iniciou a construção e todo feliz, diariamente, comentava:

- Ah, turma! Minha casa tá é linda! Vai chamar a atenção do povo de Mirantes de Periperi. Mas, o melhor dela está  embaixo da escada onde mandei construir o “peji” (quarto onde se guarda imagens do candomblé) que, aliás, ficou um colosso! Ah, os meus caboclos vão ficar que vão!...

Um dia, de tanto ouvir a história repetida, tomei uma resolução: aproveitei-me que na parte da manhã ele, contínuo de carreira, saia para entregar avisos e, sem ninguém notar,  datilografei, num papel, versos terríveis, capazes de fazer corar um frade de pedra:

“O meu quarto de caboclo

É mesmo bonito pra xuxu!

Tem caboclo chupa taca,

Tem caboclo dá o ...”

Na maior desfaçatez, enfiei a mensagem por uma fresta da mesa de trabalho de Walter (nome próprio de “Bimbinha”) e fui trabalhar, esquecendo do episódio. Quando, no fim da manhã, ele chegou e abriu a escrivaninha, deparou com os versos “cabeludos”. Primeiro ficou vermelho, depois as veias do seu pescoço cresceram. Incontido, com violência, o homem deu um murro na mesa, bradando:

- Quem foi o miserável que escreveu isto? Apareça se for homem pra eu quebrar a cara!

- O que foi, amigo? – Perguntei, sonso, sério, como se não fosse eu o “miserável que escreveu”... Aliás, abro um parêntese: ele morreria sem saber quem foi se, anos depois, eu não houvesse sido delatado por um colega comum. Contrariamente à sua reação da época do acontecido, Bimbinha riu e comentou:

- Ah, Edu, se tivesse sabido que era você, seu moleque,  tinha torcido seu pescoço, juro por Deus! Afinal, ocê estava lançado lama sobre a honra dos meus caboclos – e deu o caso por encerrado, para minha surpresa.

Mas, o melhor de todas as aventuras e desventuras de Walter ainda estava por vim: Numa Semana Santa, ele foi convidado para ir à fazenda de um colega. Exibido como sempre,  na sexta-feira,  já na fazenda, bem não chegou já foi dizendo que era um formidável cavaleiro, um jóquei e uniu as palavras à ação, passando o dia inteiro no lombo de um cavalo. O resultado disto é que as suas hemorroidas estouraram e ele teve que ficar o restante do passeio deitado de nádegas para cima, gemendo de dor e sem nenhum socorro médico já que o carro de aluguel que os levara para a fazenda, localizada em local de difícil acesso, só retornaria no domingo pegá-los.

Na segunda-feira, o pobre diabo, andando com dificuldade, apresentou-se para trabalhar. Um colega passava por ele em uma das dependências do banco e vendo-o com cara de dor, arrastando-se, perguntou-lhe o que ocorrera. Walter, então, desfiou o seu rosário de padecimentos: a dor, o sangramento das hemorroidas... O colega, contendo o riso, fingiu preocupação:

- Coitado! Amigo, vou lhe ensinar um santo remédio. Faz o seguinte: passa pasta de dentes...

Aí, o infeliz abriu um largo sorriso e, prevendo a melhora, perguntou esperançoso:

- É mesmo? Será que a dor vai passar?!

        - Bem... passar, eu não sei, não. Porém, que acaba com o mau hálito, lá isso acaba!... – respondeu o gozador que, rindo a bandeiras despregadas, tratou de dar um fora antes que um indignado Bimbinha partisse para a agressão física.

Eduardo Kruschewsky