Na  manhã luminosa do domingo, fez um tremendo esforço, pedalando. Resfolegou, de pé na bicicleta, suando por todos os poros, os músculos das pernas doendo. Subiu a íngreme ladeira já no limite das forças. Olhou para trás, os outros concorrentes cada vez mais distanciados, dando-lhe ânimo redobrado para prosseguir subindo. Já no topo,  pedalou com menos força. Andou cerca de um quilometro para iniciar a descida da ladeira em direção ao ponto de chegada. No declive, deixou a bicicleta descer  solta, “na banguela”, como dizia. As pessoas o aplaudiam, passando por  ele  rápidas.  Finalmente, cruzou a linha de chegada, acenando, tonto de alegria.

Subiu ao podium, ouvindo o coro: “É campeão! É campeão!”. Abriu um riso largo, de pura felicidade, quando recebeu o troféu e os cumprimentos do presidente da Liga de Ciclismo. Em seguida, o prefeito discursou, ressaltando as qualidades de atleta do vencedor da Corrida do Dia da Cidade. Ele, aplaudido, festejado, bajulado, invejado, era a própria imagem do herói do dia! Concluída a solenidade de entrega do troféu, a multidão dispersou-se. O campeão, sem platéia, montou na bicicleta e correu para casa. Entrou porta adentro, esbaforido, dizendo:

- Mulher! Ganhamo! Oia aqui o troféu!

- É mermo? Qui bom!

Ganhou um beijo da companheira, um abraço do filho pequeno . Sabendo o pai campeão, a criança abria um riso largo, batia palmas de contentamento e  perguntava:

-  Ganhou quanto, pai? O sinhô vai comprá a minha baike?

Ele explicou: dinheiro não era importante, de mais valia era o reconhecimento público. Suado, exaurido, foi tomar um banho demorado. Depois, almoçou e deitou-se para a sesta. Mais tarde, viu no noticiário da noite a sua cara de vencedor e ouviu os melhores comentários a respeito de sua performance. Naquele dia, dormiu em estado de glória.

Segunda feira.

Acordou cedo, escovou os dentes, tomou o café com pão sem manteiga. Olhou já com saudosismo para o trófeu conquistado no dia anterior e, em seguida, orgulhoso de ser campeão, vestiu a roupa de gari, pegou a bicicleta e foi varrer as ruas...