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André Pomponet

...E a máquina eleitoral não pode parar...

01/09/2011

 

Embora pareça enfadonho para o leitor, porque já ter tratei do tema uns meses atrás,  não consigo parar de me espantar com a imensa antecipação do debate eleitoral que se faz na Feira de Santana, em Salvador e também em outras importantes cidades brasileiras. Mal se encerraram as eleições de 2010, começou o frenesi para tratar do próximo período eleitoral, que só acontece em meados do ano que vem. Entre uma eleição e outra existe o imenso desafio de governar com o propósito de, supostamente, melhorar a vida dos cidadãos; mas quem vence e, sobretudo, quem perde, começa de imediato a se mexer pensando no próximo pleito.

            Por essa razão sites e jornais, todos os dias, divulgam enxurradas de notícias que não dizem coisa nenhuma: “oposição pretende marchar unida”, “surge mais um pré-candidato” ou “fulano diz que é cedo para falar de eleição”. Repetidas ad nauseam, essas “informações” até irritam o leitor.

A insistência talvez se deva à falta de criatividade dos repórteres dedicados à política, mas existem pelo menos duas outras razões: os opositores sem cargo precisam manter a visibilidade através da imprensa; e os pré-candidatos governistas se mobilizam para criar um clima de terror que lhes ofereça munição para barganhar uma desistência mais vantajosa lá adiante.

Uma terceira razão é que a máquina de campanha pós-Ditadura Militar se azeitou e ganhou uma sustança tal que já não se limita às eleições: segue a pleno vapor nas agências de publicidade, nos braços do cabo eleitoral que carrega o patrão no ombro e vai se nutrindo com as retribuições generosas àqueles que, abnegados, robusteceram o caixa 1 ou 2 com doações durante a campanha.

 

E o povo?

 

Nesse jogo, quem paga a conta, pra variar, é a população: enquanto rolam as futricas nos gabinetes, o cidadão médio vegeta nos intermináveis engarrafamentos das grandes cidades; enquanto uns vão polindo as insígnias das coalizões eleitorais, os traficantes distribuem crack nos centros das cidades; enquanto se brinda em recepções elegantes ou se viaja de jatinho, na periferia alguém é assassinado e um outro deixa de ser atendido no posto de saúde.

Em meio a essa dança, os debates relevantes somem do noticiário. Na Feira de Santana, seguem o caos e os engarrafamentos no Anel de Contorno; todos os dias morre gente assassinada na periferia, encorpando as estatísticas dos crimes insolúveis; a merenda chega a conta-gotas nas escolas e o transporte público segue dando vexame.

Mesmo com todos esses problemas, privilegiam-se notícias sobre o troca-troca partidário, repercutem-se com avidez notinhas plantadas e até – suprema subjetividade – dá-se ampla divulgação à troca de olhares entre dois políticos numa solenidade, o que – talvez, quem sabe – pode representar uma sólida aliança para o próximo pleito.

 

Insensatez

 

Na Bahia, muitos órgãos de imprensa vinculam-se a políticos ou a familiares de políticos: blogues, sites, jornais, emissoras de tevê e, principalmente, emissoras de rádio interior afora. É natural, portanto, que privilegiem as interpretações que favoreçam seus proprietários, sobretudo quando estão na oposição. Isso sempre aconteceu e se aprofunda pelo próprio momento que o país vive.

Os demais órgãos de imprensa, no entanto, não podem se colocar a reboque dos interesses de nenhum político ou grupo político, sobretudo quando se pretende informar e não opinar. A opinião é desejável e salutar – inclusive a partidariamente engajada – mas a informação deve atravessar um conjunto de filtros que a tornem mais asséptica e menos tendenciosa, principalmente na elaboração da pauta.

O esforço para antecipar o debate eleitoral mencionado acima cruzou a fronteira do interesse público e transita, desenvolto, na arena dos interesses da elite política: seja encobrindo as deficiências de quem está aboletado no poder, seja atendendo aos interesses de quem está sem mandato. Talvez esse seja o momento adequado para se repensar as pautas nas redações...

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André Pomponet é jornalista e economista

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