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André Pomponet

A Feira que se deseja para a próxima década (II)

06/07/2019

Em texto anterior apontamos a necessidade da construção de uma agenda para a Feira de Santana. Poderíamos defini-la como uma agenda de desenvolvimento. Mencionamos, também, algumas intervenções realizadas em Salvador que contribuem para elevar a qualidade de vida na capital, como os sistemas viários do Aeroporto e da Rótula do Abacaxi e o metrô.

Anuncia-se, para o segundo semestre, a licitação da ponte Salvador-Itaparica. Mesmo localizada a mais de uma centena de quilômetros da Feira de Santana, a badalada obra vai afetar a vida da Princesa do Sertão.

O projeto divulgado pelo governo estadual prevê que, além da ponte ligando a capital à ilha, será construído o Sistema Viário Oeste (SVO), um todo integrado que pretende facilitar a conexão entre o Oeste e a Chapada Diamantina e Salvador. Para tanto, pretende-se construir uma espécie de anel suprametropolitano, visando conectar quatro rodovias federais: as BR 324, 101,116 e 242.

Objetivamente, o projeto permitirá que aqueles que viajam para a capital e que necessitam contornar a Baía de Todos os Santos não precisarão mais fazê-lo. Bastará acessar o SVO e atravessar a ponte, encurtando a viagem e chegando pelo centro da capital baiana. A redução de tempo será significativa, mas a previsão é que o pedágio custe R$ 45.

Quem está no Recôncavo, no Baixo Sul ou viaja desde a Chapada Diamantina ou do longínquo Oeste baiano tende optar por esse caminho. Anos atrás apontamos que uma mudança tão radical tende a provocar uma reconfiguração logística em parte do território baiano. Com a intervenção, algumas regiões tendem a se tornar mais dinâmicas e, outras, perderão protagonismo.

É evidente que, caso esse cenário se confirme, há a tendência de que a Feira de Santana perca parte do seu vertiginoso fluxo diário. O Portal do Sertão vai se tornar menos portal, porque a amplitude de destinos que exigem passagem por aqui vai diminuir. Em alguma medida, todo mundo que vai para o Sul e o Oeste dispensará passar pela cidade, inclusive pela BR 101, que fica a 15 quilômetros daqui.

O dano maior, porém, é que o Sistema Viário Oeste poderá produzir impactos mais profundos, sobretudo na esfera econômica, mercantil. Quem antes comprava ou recorria à oferta de serviços daqui pode optar por seguir até Salvador cortando caminho. Ou escolher Santo Antônio de Jesus, Amargosa e até Cruz das Almas, que ficarão, geograficamente, no novo centro pulsante da economia da região.

É claro que a articulação comercial da Feira de Santana com boa parte da porção setentrional da Bahia tende a ser preservada.  Mas a conexão d o município com o Recôncavo próximo, com suas cidades mais prósperas, tende a se reconfigurar, com efeitos que exigem mensuração. O impacto, inclusive, pode ser significativo.

No passado, a vizinha Cachoeira perdeu protagonismo quando as estradas carroçáveis e, depois, as rodovias, arrebataram o protagonismo da ferrovia e da navegação de cabotagem. Cidades como Alagoinhas também foram prejudicadas quando o País abandonou a ferrovia como alternativa logística. São dois exemplos que deveriam despertar a atenção dos líderes políticos locais.

Apesar do anúncio oficial, permanece o ceticismo em relação à obra, por causa do momento econômico pouco empolgante. Também será longo o tempo até sua conclusão, mesmo que surjam poucos empecilhos. Mas, mesmo assim, é necessário começar a pensar o impacto da ponte sobre a Feira de Santana.

A Feira que se deseja para a próxima década, portanto, pode ser profundamente impactada pela ponte Salvador-Itaparica.

André Pomponet